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26 de Abril de 2024
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    A tormentosa questão dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho

    Publicado por Espaço Vital
    há 7 anos

    Por Valdete Severo, magistrada.

    Na Justiça do trabalho, como se sabe, a regra geral é a da necessidade de gratuidade da justiça. Nossos reclamantes, em sua maioria absoluta, são ex-empregados, muitos dos quais ainda estão sem fonte de sustento, enquanto brigam para receber os salários não pagos.

    Essa é a razão pela qual o trabalhador, quando não tem condições de pagar um advogado, deve informar tal circunstância na petição inicial e ter deferido o benefício da assistência judiciária gratuita. De acordo com a Lei nº 5584/70, a assistência deve ser prestada pelo sindicato da categoria profissional a que pertence o trabalhador. Daí toda a celeuma em torno da possibilidade ou não de fixar honorários de advogado a quem não tem a tal credencial sindical. Daí, também, a discussão acerca da possibilidade de cumulação dos honorários que decorrem da assistência judiciária e daqueles fixados em contrato.

    Ora, se o trabalhador declara em juízo que não tem condições de pagar seu advogado e só por isso requer o benefício da assistência gratuita, não pode posteriormente ser compelido a repassar parte do crédito alimentar que recebe em razão do processo, para quem já foi remunerado por meio dos honorários de assistência judiciária.

    Note-se que sequer no novo CPC, que cuidou exaustivamente da questão, esse raciocínio se altera. No artigo 99 há referência de que a assistência pode ser feita por advogado particular, o que justifica a superação da tese ainda esposada pelo TST, que restringe o pagamento dos honorários apenas aos advogados munidos de credencial sindical.

    Na sequência, o dispositivo faz menção a recurso sobre o valor dos honorários de sucumbência, que são incabíveis no processo do trabalho, exatamente por se tratar de um processo diferente, em que se discutem verbas alimentares, e no qual historicamente reconhecemos uma assimetria insuperável entre os litigantes.

    Aliás, esse é um dos perigos do enfrentamento da matéria sem a tranquilidade e a profundidade que o tema exige. Daqui a pouco estaremos discutindo a introdução de honorários de sucumbência no processo do trabalho ou - como ouvi esses dias - a necessidade de alteração da lei para exigir prévio recolhimento de custas, a fim de obstar o ajuizamento de ações trabalhistas.

    Quem ganhará com isso? Certamente não será o trabalhador, nem o Estado Social e muito menos os advogados que patrocinam causas trabalhistas.

    A iniciativa “orquestrada” pelos juízes do Trabalho em nada difere do que a Justiça Federal já faz há muito tempo, sem nenhum alarde. A emissão de alvarás separados, para o trabalhador e para o advogado, permite transparência e segurança, inclusive para o profissional que atuou nos autos e que terá o valor do seu trabalho resguardado.

    O mais importante é garantir que tanto o trabalhador quanto o procurador por ele contratado recebam o que lhes é de direito. A preocupação que move os magistrados trabalhistas é a de atender aos fundamentos que justificam a existência mesma da Justiça do Trabalho, reconhecendo o direito do advogado de receber seus créditos e evitando, no mesmo passo, a renúncia dos créditos trabalhistas, cuja natureza alimentar a Constituição reconhece.

    A medida, em médio prazo, fará com que mais aplicadores do direito percebam que já passou da hora de reconhecer o direito de o advogado receber dignamente pelo seu trabalho, provocando a revisão da Súmula nº 219 do TST. Isso porque a apresentação do contrato de honorários e posterior separação dos créditos evidenciará o fato de que os trabalhadores não estão tendo a reposição efetiva dos prejuízos que suportam quando há inadimplemento de verbas salariais.

    Precisamos urgentemente reconhecer que é inviável pretender atribuir ao empregado o ônus de arcar com os honorários do advogado, na medida em que essa prática equivale, na realidade concreta da vida, promover renúncia a créditos trabalhistas, cujo pagamento, à época própria, já foi sonegado ao trabalhador.

    Não sendo o trabalhador quem deu causa à existência da lide e já havendo arcado com o ônus decorrente do tempo do processo, revela-se flagrantemente desproporcional que a ele se imponha a consequência dos descumprimentos dos deveres contratuais e legais de quem sonegou direitos.

    Ao contrário, embora seja impossível apagar a integralidade dos dissabores causados pelo não pagamento de verbas trabalhistas, referentes à angústia com a injustiça, a postergação da reintegração patrimonial e toda sorte de transtornos decorrentes do litígio judicial, é indispensável que em caso de condenação o empregador arque com a integralidade dos prejuízos econômicos diretamente causados, inclusive com custeio dos serviços dos profissionais que se fizeram necessários para viabilizar ao empregado a concretização dos seus direitos.

    Parece-me, pois, que as armas estão apontadas para a direção errada, sobretudo em tempos tão sombrios para a Justiça do trabalho, em que temos batalhas tão mais graves para enfrentar.

    Os juízes do trabalho e os advogados trabalhistas têm capitaneado medidas importantes para barrar ou pelo menos levar à discussão pública temas como a terceirização, a reforma trabalhista ou a previdenciária. Temos consciência, tenho certeza, do momento histórico que estamos vivendo, em que os ataques à Justiça do Trabalho, com a ambição de finalmente extingui-la, não dão trégua.

    A AMATRA e a AGETRA vêm travando conversas profícuas, inclusive sobre o tema dos honorários de advogado. É possível construir um discurso comum, que valorize o trabalho do advogado e ao mesmo tempo respeite a irrenunciabilidade dos créditos trabalhistas. Ataques que misturam assuntos diversos e acusam a magistratura trabalhista de objetivos escusos em nada auxiliam nesse processo.

    E se não avançarmos, reconhecendo a importância de preservar a Justiça do Trabalho e valorizar os profissionais que atuam no processo trabalhista, perderemos todos, sem qualquer exceção.

    >>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>Leia na base de dados do Espaço Vital:

    Ação orquestrada de magistrados trabalhistas contra a advocacia gaúcha > Artigo da advogada Bernadete Kurtz

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