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18 de Abril de 2024
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    Aposentadoria compulsória: prêmio ou castigo?

    Publicado por Espaço Vital
    há 12 anos

    Por Meigla Maria Araújo Merlin,

    procuradora do Município de Belo Horizonte

    As regras da aposentadoria compulsória foram fixadas com base na presunção de que a aptidão para o trabalho e a atividade intelectual se tornam cada vez menores à medida que a idade avança.

    No entanto, essa lógica anacrônica não corresponde a uma visão atual, baseada em indicadores sociais da realidade brasileira, e nem todos os países a adotam.

    Sem pretender fazer uma incursão pelo direito administrativo, rememorando os ensinamentos transmitidos em sala de aula pelo saudoso professor Paulo Neves de Carvalho, na vetusta Casa de Afonso Pena, é imperioso propor uma revisão e uma reavaliação das regras vigentes sobre a aposentadoria compulsória.

    Nos termos do artigo 40, § 1º, da Constituição Federal, os servidores abrangidos pelo regime de previdência serão aposentados por uma das três modalidades: invalidez permanente, que pode ou não decorrer de acidente em serviço, de moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável; compulsoriamente, aos 70 anos; ou voluntariamente, desde que preenchidas as condições expressas no mencionado dispositivo constitucional.

    A alegoria da Antiguidade clássica, segundo a qual a ave de Minerva levanta voo ao entardecer, pode muito bem ilustrar essas linhas, por meio das quais se busca demonstrar que a sabedoria é cultivada através de longos anos e alcança seu ápice na idade madura. É preciso ousar discordar dessa cultura cristalizada de associação entre idade e incapacidade para o trabalho.

    Até mesmo consagrados juristas como Maria Sylvia Zanella di Pietro, ao abordar essa questão, consideram que, na modalidade de aposentadoria compulsória, a invalidez é presumida. Segundo a ilustre doutrinadora, a norma se justifica, uma vez que a idade de 70 anos cria uma presunção absoluta de incapacidade para o serviço público.

    Contra essa presunção absoluta de incapacidade pode-se argumentar que a regra em questão não atinge os altos mandatários, como presidente da República e ministros de Estado. Paradoxalmente, os cargos para os quais se exige maior responsabilidade podem ser ocupados por pessoas acima de 70 anos.

    A propósito, o país assistiu recentemente à cerimônia de posse do chanceler Celso Amorim, que está prestes a completar 70 anos, no cargo de ministro da Defesa. Ninguém duvida que ele possa trazer relevante contribuição a um dos ministérios estratégicos para a soberania brasileira, da mesma forma como participou de forma brilhante como ministro das Relações Exteriores durante o governo Lula.

    Em outros países, os exemplos são incontáveis: Adenauer governou a Alemanha dos 73 aos 87 anos. Churchill tinha 76 anos quando foi reeleito como primeiro-ministro inglês, em 1951. Os juízes da Suprema Corte americana são vitalícios.

    A aposentadoria por invalidez permanente, modalidade também prevista na Carta Magna, deveria ser a única forma de aposentadoria involuntária no serviço público. Se os servidores mais jovens são bem-vindos pela sua força e dinamismo e pela sua capacidade de adaptação às novas tecnologias, os servidores maduros, em plena atividade física e intelectual, são também indispensáveis, pela sua experiência, prudência e sabedoria.

    É preciso considerar que, da época em que foram lançadas as bases da legislação sobre a aposentadoria compulsória até hoje, houve um avanço significativo nos indicadores sociais do país. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos últimos 30 anos a esperança de vida ao nascer passou de 62,57 para 73,15 anos. Nesse mesmo período, duplicou o percentual da população com 70 anos ou mais. A previsão é que essa faixa etária duplique mais uma vez, representando 8,63% dos brasileiros em 2030.

    Um contingente enorme de pessoas se aposenta compulsoriamente a cada ano no Brasil, quando ainda está em plena capacidade física e intelectual. O país se priva de valiosos servidores, que passam a atuar na iniciativa privada, apenas porque completaram 70 anos.

    A aposentadoria compulsória tem sido aplicada como pena para alguns servidores públicos flagrados em atos ilícitos, o que, na verdade, constitui mais um prêmio que um castigo. Paradoxalmente, uma legião de servidores exemplares que, com a sua atuação, honram a advocacia pública e o serviço público em geral, têm sido penalizados ao ser ceifados, contra a sua vontade, da categoria dos servidores ativos.

    Assim ocorre com grandes juristas, desembargadores dos tribunais de Justiça dos estados, ministros do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Assim ocorre com procuradores da União, dos estados e dos municípios.

    A propósito, não pode ficar sem registro a aposentadoria compulsória neste mês de Saulo Converso Lara, um dos mais ilustres procuradores do município de Belo Horizonte. Sua ausência deixará um vácuo na Procuradoria Geral do Município e seu nome será sempre lembrado pela atuação brilhante nos quadros da advocacia pública. Seu exemplo certamente permanecerá como inspiração e incentivo para as futuras gerações de procuradores.

    Que essa homenagem a um servidor que se retira do serviço público no auge da sua capacidade intelectual, levando consigo a experiência adquirida ao longo de mais de três décadas de relevantes serviços prestados ao município de Belo Horizonte, sirva de alerta à sociedade brasileira, desencadeando movimento nacional pela mudança na legislação sobre a aposentadoria compulsória.

    imprensa@pbh.gov.br

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