Testemunhas de Jeová
Por Guilherme Dettmer Drago,advogado (OAB/RS nº 52.242)
Em julgamento recente, o TJRS reconheceu o direito de uma mulher - que é testemunha de Jeová - deixar de receber transfusão de sangue (Espaço Vital de 10.05.2010).
Na verdade, o tema atinente às Testemunhas de Jeová que se recusam a receber sangue alheio em caso de acidentes é deveras complexo.
Todavia, muitas pessoas criticam tal posicionamento, considerando-o absurdo, visto que tais pessoas prefeririam a morte a serem tratadas e curadas. Ocorre que a questão abre um espectro de discussão muito interessante. Quem é adepto de tal religião o é porque optou por isso e aceitou seguir à risca seus dogmas.
Vivemos numa sociedade onde o pluralismo religioso está protegido pela Constituição Federal e onde prevalece a autodeterminação pessoal e o dever de respeito aos praticantes de qualquer religião, seja ela qual for.
Se o paciente é autônomo, ou seja, apto a decidir sobre sua própria vida e totalmente esclarecido de todos os bônus e ônus de sua decisão, deve sua vontade ser respeitada, por mais absurda que alguns possam compreender. Neste tópico a decisao do TJ gaúcho andou muito bem.
Afinal, no Brasil, a pessoa autônoma pode optar por morrer a ser curada!
O que se questiona é: existem justificativas ético-deontológicas para que uma equipe médica discorde da decisão do paciente Testemunha de Jeová e, mesmo contra a sua vontade, ministre em seu corpo sangue alheio, com o objetivo de lhe salvar a vida?
Creio que a resposta beira a uma negação peremptória. O paternalismo médico não deve ser levado em conta em tais situações, mesmo que a equipe médica tenha por objetivo o beneficiamento do estado de saúde do paciente (aplicação do princípio etico da beneficência e não-maleficência).
Teríamos, nesse caso, a violação do princípio ético do respeito à autonomia, o que no nosso entender se mostraria uma situação deveras grave. Todavia, não podemos acoplar a nossa Constituição Federal os preceitos contidos na Bíblia Sagrada!
Nesse particular, questiona-se: e se o paciente Testemunha de Jeová for um menor, sem autonomia? E se os seus pais não permitirem a transfusão? E se sem a transfusão o menor vier a falecer?
Se o paciente é menor (absolutamente ou relativamente incapaz), tenho para mim que o poder dos pais ou responsáveis deva, necessariamente, entrar em conflito ético e legal com os valores paternos da sociedade como um todo.
O próprio STF, em diversos julgamentos, entendeu que, nesses casos, optar-se-ia pelo direito à vida da criança ou adolescente, opinião essa seguida por diversos conselhos de ética e comitês de bioética.
A justificativa é razoável: temos no menor um ser em desenvolvimento quanto à sua própria autonomia. Se sopesarmos sua falta de autonomia com o direito à vida, prevaleceria esse último.
Eis um assunto a ser pensado e discutido.
guilhermedrago@bol.com.br
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