Onus probandi incumbit ei qui asserit
A primeira versão é da jovem doméstica. Quando ela, num dia útil de fevereiro do ano passado, desempenhava atividades laborais na residência de seus patrões, o ativo empresário solicitou que ela fosse até o dormitório do casal, para a limpeza de alguns aparelhos. A esposa estava na praia. A filha do casal, estudando na Austrália.
Ao lado do aprazível leito com vista para o Guaíba, a serviçal ouviu do patrão que "não precisaria limpar nada". Escutou, também, a proposta para uma consentida incursão ao esguio corpo feminino - lopo acompanhada da tentativa de um passa-mão. A doméstica reagiu, bateu em retirada, ameaçou gritar. Com o apoio do marido, ela foi à delegacia de polícia registrar queixa.
A segunda versão é do ativo homem de negócios. Ele voltara à residência para apanhar o laptop que esquecera no dormitório, quando a empregada - "nem tão jovem assim, tipo comum, nada de interessante - teria adentrado de blusa aberta, sutiã à mostra e feito uma proposta,"prontamente recusada":
- Patrãozinho, vamos aproveitar que estamos sós. Depois, o senhor me dá uma ajudazinha financeira...
Como o caso bateu em Juízo, a peça de defesa prévia afirma que" o querelado é que foi assediado pela querelante ". Tentativa de conciliação inexitosa, a ação penal foi recebida, ouvindo-se o réu. Como não foi postulada produção de prova oral, foi encerrada a instrução. Oferecidas as alegações finais pelas partes e manifestação do Ministério Público, foi absolvido o réu, com fundamento no art. 386, IV, do C.P.P.
A doméstica apelou, postulando a reabertura da instrução do feito, com a quebra do sigilo telefônico do agora já ex-patrão, para que ficasse comprovado que - durante a tramitação da ação - este contatara aquela"para propor uma composição entre ambos".
O voto do relator é técnico:" não houve requerimento de produção de provas, nem mesmo da oitiva da ofendida, com o que não veio aos autos, na fase judicial, nenhum elemento probatório, existindo, tão-somente e em contraposição, as alegações contidas na inicial acusatória e as declarações do querelado que, como visto, não aceita a imputação ".
O julgado veio também carregado no latim e em grandes nomes do Direito Penal." Com fulcro na máxima ´onus probandi incumbit ei qui asserit´, a prova da alegação incumbirá a quem fizer - é o que ensinam Tourinho Filho, Hans Sperl e Francesco Carnelutti ".
A decisão absolutória transitou em julgado. A esposa do empresário já fechou questão: como ele não pode, durante o verão, ficar longe dos negócios de segunda a quinta, ela lhe fará vigilante companhia nos sete dias da semana. De segunda a quinta, na zona sul, em Porto Alegre. Sábado e domingo em Xangri-lá.
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